A Mata Atlântica é um bioma sul-americano de imensa biodiversidade, com muitas espécies únicas que não ocorrem naturalmente em nenhum outro lugar do mundo. Entre as aproximadamente 9.500 espécies de plantas nativas, cerca de 8.400 são endêmicas, ou seja, encontradas exclusivamente neste bioma. As informações são da Folha de S. Paulo.
Um estudo realizado por pesquisadores do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) revelou que produtos e tecnologias desenvolvidos a partir de 66 plantas endêmicas da Mata Atlântica resultaram no registro de 118 patentes entre 2000 e 2021. No entanto, apenas 21 dessas patentes foram desenvolvidas e registradas no Brasil. A China lidera com 54 patentes, seguida pelos Estados Unidos (15), países europeus (sete) e o Japão (três).
As espécies com maior número de patentes são a sálvia flor-de-cardeal (Salvia splendens) com 34 patentes e a gloxínia (Sinningia speciosa) com sete patentes, nenhuma delas registrada no Brasil.
O estudo ressalta a importância de mecanismos para controle, acesso e proteção dos recursos genéticos brasileiros. Contudo, não é possível confirmar se o acesso a essas espécies se deu por meio de plantas retiradas diretamente do Brasil ou de espécimes cultivados ou naturalizados em outros países.
Celise Villa dos Santos, pesquisadora do INMA e uma das autoras do estudo, aponta que é difícil reconhecer a origem do patrimônio genético em patentes quando não declarado. Desde a colonização do Brasil, houve grande mobilidade de espécies vegetais entre continentes. Espécies endêmicas do Brasil podem ter se tornado “nativas” em outros países ao longo dos séculos.
Os atuais mecanismos de concessão de patentes e de controle de acesso à biodiversidade são limitados para identificar a origem do patrimônio genético, dificultando o reconhecimento de possíveis atividades de biopirataria.
Celise sugere que a implementação de um certificado internacional de origem poderia resolver esses problemas, mas sua adoção está em negociação na Organização Mundial do Comércio (OMC) desde 2011.
O Sistema de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (SisGen), implementado no Brasil em 2017, só controla o acesso à biodiversidade e tecnologias desenvolvidas e protegidas dentro do país.
Outras Espécies
O levantamento também identificou 1.148 patentes de 72 espécies de plantas nativas, mas não endêmicas da Mata Atlântica. Muitas dessas espécies são nativas de outros países, como o musgo Rhodobryum roseum, líder em patentes com 263 registros, devido às suas propriedades químicas e medicinais. Outras espécies ocorrem apenas no Brasil, mas não exclusivamente na Mata Atlântica, como o jaborandi (Pilocarpus spicatus). Das patentes de plantas nativas não endêmicas, o Brasil possui apenas 21, ou 2% do total.
Inovações tecnológicas são um potencial para aumentar a eficiência econômica do Brasil e melhorar a competitividade no comércio internacional, especialmente considerando a grande variedade de espécies nos seis biomas brasileiros e o conhecimento tradicional sobre seu uso.
Desde a década de 2000, políticas públicas e mecanismos de incentivo à bioeconomia têm impulsionado a estratégia de patentear biotecnologias no Brasil, embora com desafios. As patentes brasileiras com espécies da Mata Atlântica são predominantemente depositadas por universidades e institutos de pesquisa públicos, que enfrentam dificuldades com os custos envolvidos no depósito e manutenção das patentes.
A proteção de invenções depende de questões culturais, políticas públicas de incentivo e estratégias empresariais. Apesar de a Amazônia ter menos espécies vegetais que a Mata Atlântica, produtos e tecnologias baseados em plantas amazônicas são mais patenteados devido a estratégias de marketing e à presença de instituições como o Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), dedicadas ao desenvolvimento de tecnologias e proteção de propriedade intelectual.
O estudo mostra que muitas das espécies da flora da Mata Atlântica com patentes estão ameaçadas de extinção. Com apenas 12% da vegetação nativa remanescente e 82% das espécies endêmicas ameaçadas, há um alerta para a potencial perda de recursos que poderiam ser melhor explorados para o desenvolvimento de produtos e tecnologias.
Em junho de 2024, o governo brasileiro lançou a Estratégia Nacional de Bioeconomia, com diretrizes e objetivos para o desenvolvimento de cadeias de produtos, processos e serviços que utilizam recursos biológicos e tecnologia avançada para criar produtos mais sustentáveis.
Fonte: Terra Brasil Notícias